sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Literacias multimodais: « Eles não sabem escrever!»
















O número 16 da revista Intercompreensão   tem como tema« Literacias académicas Multimodais». «Com a coordenação de Clara Ferrão Tavares e de Luísa Álvares Pereira, procura centrar-se numa problemática actual e relevante do ponto de vista das transformações por que está a passar o Ensino Superior em Portugal - as Literacias Académicas Multimodais. E desta forma, pretende contribuir para a tematização de um campo que não tem sido objecto de grande reflexão entre nós, apesar da sua tradição em outros países.
Na realidade, quer nos Estados Unidos – Composition Studies –, quer em Inglaterra – Academic Literacies –, esta temática tem já ampla produção de conhecimentos, procurando-se, em alguns países europeus, dialogar com estes dois campos, no sentido de potenciar o conhecimento e  de contribuir para uma reflexão mais rigorosa e mais fecunda  do ponto de vista da Leitura e da Escrita no Ensino Superior. Em França, têm sido organizados vários colóquios sobre esta temática e a Revue de Linguistique et Didactique das Langues (LIDIL), publicada pela Universidade de Grenoble  também tem dedicado largo espaço a esta temática.
Uma nova perspetiva de abordagem das literacias numa ótica de educação plurilingue e pluricultural  tem-se vindo a desenvolver nos últimos anos. Na Platformof resources and references for plurilingual and intercultural education do Conselho da Europa, figuram, na actualidade, vários estudos que questionam as línguas-culturas em relação com outras matérias curriculares. Entre os estudos disponibilizados nesta plataforma, os de Jean-Claude Beacco, Daniel Coste e Piet-Hein van de Vem e Helmut Vollmer põem em evidência a necessidade de desenvolver nos estudantes uma competência plurilingue e pluricultural que, além de permitir transferências entre as línguas-culturas, torne possível ao sujeito movimentar-se nas linguagens que veiculam saberes nas áreas das Ciências Sociais, das Ciências da Natureza e da Matemática.
No caso de Portugal, e tendo em conta que, com o Processo de Bolonha, se reforça a autonomia do estudante na realização de trabalhos académicos, a reflexão em torno das literacias académicas multimodais tem emergido a partir, sobretudo, da dificuldade diagnosticada nos alunos, por parte dos professores, em dominar a leitura e a escrita de géneros académicos a que estão expostos neste contexto. Com efeito, além dos aspectos referenciais dos géneros, estes requerem a gestão e a proficiência em técnicas socioculturais, discursivas e sociolinguísticas, que os estudantes nem sempre dominam. Construir uma tese, uma dissertação, uma monografia, um relatório, um projeto… implica caracterizar, num primeiro tempo, os géneros discursivos que enformam cada tipo de trabalho. Por estas razões, compreende-se quer a dificuldade dos estudantes na aculturação a géneros académicos quer a própria dificuldade dos professores na orientação de todo este processo. Assim, a tematização em torno das literacias académicas tem permitido, antes de mais – mas não só –, questionar a forma como podem ser interpretadas as dificuldades dos estudantes na leitura e na escrita, deslocando o foco da análise para a relação com os contextos nos quais os estudantes escrevem e, logo, para a forma como estes são capazes de entrar nos universos linguístico-culturais exigidas pelas diferentes unidades curriculares. Considerando-se que muitas práticas académicas implicam o recurso a linguagens híbridas declinadas em diferentes meios tecnológicos e em diferentes dispositivos de criação e de partilha de conteúdos, a dimensão multimodal não pode deixar de ser objecto de integração nas designadas literacias académicas.
Conceber os escritos no Ensino Superior como géneros discursivos pressupõe, portanto, uma focalização nos usos reais da língua-cultura em contexto, passando, também, por uma reflexão sobre os diversos eixos temáticos inscritos no universo das próprias literacias. As Literacias Académicas Multimodais podem, por conseguinte, ser entendidas como práticas de cultura a que estão associadas diversas capacidades de agir  no que diz respeito ao tratamento de diferentes textos e linguagens, em diferentes canais, suportes e espaços,  e em condições temporais e  em situações contextuais plurais e, consequentemente, distintos.
Partindo destes pressupostos e das exigências em matéria de Literacia Académica Multimodal, a habitual prática em centrar a intervenção docente no domínio de conteúdos disciplinares específicos tem-se revelado insuficiente face às dificuldades de vária ordem, decorrentes não só da componente linguística (ortográfica, lexical, morfológica, sintática…), como também, sobretudo, da competência referencial, em articulação com a área de especialização,  em que os estudantes se situam, e das competências discursiva e pragmática (em relação com o contexto e com a cultura académica), entendidas numa dimensão plurisemiótica. Atendendo a toda esta realidade, constata-se a necessidade evidente quer de um ensino mais sistemático das especificidades linguística, discursiva e multimodal dos géneros académicos quer de um questionamento dos próprios moldes em que este ensino pode ser feito e do tipo de instâncias das instituições de Ensino Superior em que deve ser proposto.
No contexto Português, e em virtude do aumento de cursos de pós-graduação (de Mestrado e de Doutoramento), esta temática começa, finalmente, a ser contemplada em muitos Seminários e em tantos outros Cursos de escrita científica. Por outro lado, a esta temática aglutinam-se outras que com ela fazem transfronteira e que nos remetem para uma melhor compreensão do universo cultural dos estudantes do Ensino Superior e das suas eventuais dificuldades em se integrarem na língua-cultura da escrita deste nível de ensino. É claro que muitas das questões que se colocam hoje, entre nós, não se centram em torno de um núcleo duro de temáticas. Núcleo este, aliás, próprio de quem já fez caminho e definiu um campo e uma problemática mais específicos para tratamento das Literacias Académicas Multimodais.
(...) 

Os artigos reunidos neste número  permitem, em síntese,  por um lado, levantar questões diversas relacionadas com a problemática das literacias multimodais e, por outro lado, propor pistas para o próprio desenvolvimento destas mesmas vias no Ensino Superior, sem, no entanto, descurarem a continuidade que a aprendizagem das diferentes linguagens implica no processo de desenvolvimento linguístico e cultural do indivíduo».  
Fragmento da Apresentação no número  assinada pelas duas coordenadoras deste número. 




Intercompreensão, REDINTER e Agradecimentos


Em julho, foi publicado e apresentado publicamente o número 3 da Revista  REDINTER- Intercompreensão, no âmbito do Colóquio Protextos e do Seminário EDILIC (com a presença de alguns dos colaboradores deste número da Revista),  na Universidade de Aveiro.

No evento, que sucedeu às conferências de de Charles Bazerman, da Universidade de Califórnia, de David Russel da Universidade de Iwoa e de Monserrat Castelló da Universidade Ramon Llull de Barcelona,   intervieram a Diretora do CIDTFF da Universidade de Aveiro, o  Diretor da UIIPS do IPS de Santarém      (Unidade de Investigação, no âmbito da qual foi conduzida a investigação nos projetos), a  diretora das Revistas REDINTER- Intercompreensão e  Intercompreensão, uma representante do Projeto Protextos e uma representante do EDILIC.

No mesmo evento, foi lançado o número 2 da Redinter- Intercompreensão , já disponivel  em linha e o número 16 da Revista Intercompreensão.


A diretora das Revistas, Doutora Clara Ferrão (uma 3ª pessoa fica bem nas circunstâncias!) ,  aproveitou o evento para, em seu nome pessoal e da Doutora Josette Fróis(diretora adjunta da Revista Intercompreensão, desde  1991 e colaboradora do projeto REDINTER)  agradecer  ao Presidente Fundador da Revista Intercompreensão, professor Santana Castilho, ao Senhor Presidente do IPS,  aos membros dos Conselhos Diretivos da ESE,   ao atual Diretor da UIIPS  que como unidade de investigação tem por vocação agregar  e dinamizar a investigação científica do IPS), a todas as Comissões Cientícas  e Redatoriais,  membros de projetos, autores, professores e alunos envolvidos em projetos e às gráficas, nomeadamente à Cosmos que publicou os últimos números. 

Agradeceu, em seguida, à coordenadora nacional da REDINTER, rede internacional com cerca de 50 parceiros,   Doutora Filomena Capucho, ao Co- Diretor, Doutor Christian Ollivier,  e a todas as comissões, membros, autores a confiança que nela haviam depositado, ao entregar-lhe a co-direção da  Revista irmã da Intercompreensão: A revista REDINTER- Intercompreensão.  

Aproveitou para se despedir, desejando felicidades às equipas futuras e anunciando as recentes funções assumidas na direção nacional da Revista Synergies do GERFLINT- Groupe d'Études et de Recherches pour le Français Langue International, apoiado pela Maison des Sciences de l'Homme e o Ministére des Affaires Étrangères: Synergies- Portugal,  agradecendo ao CIDTFF a disponibilidade para acolher a revista em Portugal e ao Institut Français da Embaixada de França a intenção de a apoiar. 

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Dia Europeu das Línguas- Manifesto da FNAPLV


Neste dia, começo por cumprimentar todos os meus colegas professores, formadores, didatas das línguas-culturas! O nosso entusiasmo aliada aos nossos saberes e competências têm contribuído, durante anos para «as línguas na educação e para a educação». Estamos de parabéns!  Não podemos perder a militância, apesar do contexto desfavorável!  Sem acreditarmos e colocarmos paixão no que fazemos não há ensino, nem aprendizagem... Até podem invocar muitas razões apoiadas em muitas estatísticas, muitos relatórios, mas não dá...

É por isso que, neste dia, não podia ficar calada. Já fiz  uma conferência ,  em outras circunstâncias, na semana passada, no Colóquio da APEF e da  APHELE. Podem seguir-me neste blog. Mas... aqui há mais emoção... 

Dia Europeu das Línguas... seria um dia para estarmos contentes. No entanto, quem está contente neste país, qual o professor contente, qual o professor de línguas-culturas contente?

Por muitas críticas que possam ser feitas às orientações da União Europeia sobre as línguas (visão economicista, centrada sobre o emprego), ou sobre os documentos  das equipas do Conselho da Europa      ( pouca representatividade dessas equipas  mas estas têm  uma visão mais humanista... necessidade de viver com os outros) há uma perspetiva de abordagem plurilingue e pluricultural que foi acordada pelos membros da União Europeia.

«Le plurilinguisme est moins cher que les guerres» (reproduzo de memória a intervenção de Jean Claude Beacco no ultimo Colóquio da Federação Nacional das Associações de Línguas Vivas).

É por isso que não podemos calar-nos!

Na Plataforma do Conselho da Europa

LANGUAGES IN EDUCATION, LANGUAGES FOR EDUCATION

(versão em Inglês para que todos possam ler!)  as equipas do Senhor Ministro da Educação poderão informar-se sobre  alguns compromissos assumidos (não são só os compromissos com a Troica que serão para seguir!).

Poderão encontrar nomeadamente o documento   From linguistic diversity to plurilingual education: Guide for the development of language education policies in Europe  com todas as referências em matéria de recomendações europeias. Nem todas são recomendações...


E depois há necessidade de ouvir quem sabe, quem quem estudou, quem agiu durante  anos sobre o Ensino das Línguas e das Culturas e sobre a formação de professores. Ouçam a nossa Federação de Associações:

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Desabafo sobre reforma de políticos


Acabei de receber um mail com esta preciosidade em português, mas fui buscá-la ao francês. Depois falarei das reformas dos políticos. 

Extrait d’une conversation entre Colbert et Mazarin sous LOUIS XIV
Nos gouvernants n’ont rien inventé, même méthode que sous l’ancien régime
Colbert : Pour trouver de l’argent, il arrive un moment où tripoter ne suffit plus. J’aimerais que Monsieur le Surintendant m’explique comment on s’y prend pour dépenser encore quand on est déjà endetté jusqu’au cou…
Mazarin : Quand on est un simple mortel, bien sûr, et qu’on est couvert de dettes, on va en prison. Mais l’Etat… L’Etat, lui, c’est différent. On ne peut pas jeter l’Etat en prison. Alors, il continue, il creuse la dette ! Tous les Etats font ça.
Colbert : Ah oui ? Vous croyez ? Cependant, il nous faut de l’argent. Et comment en trouver quand on a déjà créé tous les impôts imaginables ?
Mazarin : On en crée d’autres.
Colbert : Nous ne pouvons pas taxer les pauvres plus qu’ils ne le sont déjà.
Mazarin : Oui, c’est impossible.
Colbert : Alors, les riches ?
Mazarin : Les riches, non plus. Ils ne dépenseraient plus. Un riche qui dépense fait vivre des centaines de pauvres.
Colbert : Alors, comment fait-on ?
Mazarin : Colbert, tu raisonnes comme un fromage (comme un pot de chambre sous le derrière d’un malade) ! il y a quantité de gens qui sont entre les deux, ni pauvres, ni riches… Des Français qui travaillent, rêvant d’être riches et redoutant d’être pauvres ! C’est ceux-là que nous devons taxer, encore plus, toujours plus ! Ceux là ! Plus tu leur prends, plus ils travaillent pour compenser…
C’est un réservoir
inépuisable.
Extrait du « Diable Rouge » de Antoine Rault

Alguns reformados cometeram um pecado! Nasceram, trabalharam muitos anos, como foram bons alunos e não reprovaram, começaram cedo a trabalhar, descontaram muitos anos, aposentaram-se com penalização ou não... continuam a trabalhar pro bono, quando convém às instituições...  E atribuem-lhes culpas pelos gastos excessivos!  Mas há outros, os políticos (e bem me incomoda como democrata falar nisto!), mas, em todos os partidos, os políticos trabalharam poucos anos, descontaram poucos anos e recebem reformas muitos anos. Como é isto possível Senhora Presidente da Assembleia?  Como é isto possível Senhores Ministros, Deputados? Em outros países, como o sublinhava uma candidata aos Açores, os ministros deram o exemplo, reduziram-se salários, despesas de deslocação, ajudas de custo? Poderá ser até simbólico, mas os símbolos estão em todo o lado! No nosso caso, não houve problema em mudar as regras e no caso dos senhores deputados, ministros,presidentes de câmaras... que o foram há muitos, muitos anos ou até há poucos, as regras não se podem mudar? 
  

Relatório internacional sobre literacia: comentários pessoais


Foi publicado o relatório EU HIGH LEVEL GROUP OF EXPERTS ON LITERACY , em  9 de setembro sobre a literacia, com base num estudo que decorreu de fevereiro de 2011 a junho de 2012. O perito português que  integrou o grupo foi o Engenheiro Roberto Carneiro. Os textos em Inglês (não vi ainda  versões do Relatórios em outras línguas!) são transcrições desse documento.

Alguns comentários:

«MULTIPLE LITERACY
Multiple literacy: the ability to use reading and writing skills in order to produce, understand, interpret and
critically evaluate multimodal texts»

A questão da aprendizagem da leitura de textos multimodais que tenho modestamente defendido! Ver brochura do PNEP Implicações das TIC no ensino da língua. A importância das TIC no desenvolvimento da literacia é enfatizada também no Relatório.  Procurei dar algum contributo  para o uso das TIC  com vista ao desenvolvimento das literacias multimodais, no PNEP. Hélas!

Quanto ao Currículo:
«A COHERENT LITERACY CURRICULUM

Too often, curricula have a limited view of literacy, namely as just the ability to decode and encode, read and write, or, if somewhat more advanced, to produce a varied set of texts of different genres appropriate to different situations.
Over and above these basic aims, however, the literacy curriculum should focus on developing a set of composite skills that will enable learners to decode and negotiate critically the cultural, social, political and ideological aspects of language use. It is therefore essential to cultivate critical literacy skills, being able to ‘read’ culture, identities and ideologies and different uses of language».


Há sempre o perigo de leituras redutoras!



Finalmente!

«Portugal is among the countries with the most spectacular improvement in PISA-results in the past decade».(Graças ao Plano Nacional de Leitura e ao PNEP, não? (O caminho das letras é mencionado como exemplo de e-livro)

As línguas estão nas outras disciplinas. Ver

LANGUES DANS L’EDUCATION, LANGUES POUR L’EDUCATION

Plateforme de ressources et de références
pour l’éducation plurilingue et interculturelle

O último  número da Revista  Intercompreensão (nº 16) - IPS de Santarém, Edições Cosmos  centra-se nas literacias académicas nas perspetivas multimodal e plurilingue (as línguas nas outras matérias).



«Mainstreaming reading literacy across the curriculum, addressing reading aspects in the subject curricula
throughout secondary education, whether in academic or vocational routes. Curricula need to integrate more reading and comprehension aspects in other subject areas besides the national language, such as mathematics, science and technology»

Precisa-se de formação de professores, mas os professores não podem sair das escolas, as escolas não têm formadores (muitos aposentaram-se), não têm dinheiro para pagar a formadores, os professores não têm dinheiro para pagar inscrições nos colóquios e «têm  de dar aulas»! E os colóquios não têm ninguém.  E?


«Teacher education
Excellent initial teacher education is essential. The better qualified teachers are, the better their learners’ results. But qualifications alone are not enough; teachers need a high level of professional competence. Prospective teachers should be taught detailed subject-specific knowledge about literacy (e.g. the processes involved in reading and writing), general pedagogical skills (e.g. controlling and motivating classes),
and a wide range of literacy-specific teaching strategies, including those for word identification and comprehension; they should also be taught appropriate assessment techniques and how to diagnose and address reading problems»

E por isso... no relatório fala-se da necessidade de formar  um perfil de professor  especialista em leitura e depois... todos os professores são professores de literacia....


«SPECIFIC RECOMMENDATIONS RELATING
TO ADOLESCENTS:
1. MAKE EVERY TEACHER A TEACHER OF LITERACY
• Adapt teaching approaches so that reading and writing are taught as essential skills across the secondary curriculum.
• Raise awareness among teachers about the importance of literacy skills for all courses, in order to stimulate all teachers to see reading and writing as part of their responsibility.
• Mainstream reading literacy across the curriculum, addressing reading aspects in the subject curricula throughout secondary education, whether academic or vocational».


E voltamos à questão da formação de professores: as línguas estão nas outras disciplinas, mas para que todos os professores  se deem conta de que, em todas as disciplinas,os alunos precisam de DEFINIR, COMPARAR, CONTAR,QUANTIFICAR,QUALIFICAR, SITUAR NO TEMPO, NO ESPAÇO, FORMULAR HIPÓTESES, EXPRIMIR  A NOÇÃO DE CONSEQUÊNCIA, CAUSA...   é necessária não só uma conceção nova (até é velha!) de aprendizagem da língua materna, mas também das outras línguas-culturas (A perspetiva plurilingue  da Plateforme do Conselho da Europa é uma via possível) mas também uma formação em línguas de outros professores. E onde está a formação de professores?



segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Provas de Agregação de Helena Araújo e Sá

Há muitos, muitos anos, depois de um «Doctorat de 3e Cycle» em França, estava para ser contratada pelo então, creio, Departamento de Educação da Universidade de Aveiro.   Estava tudo decidido, já estava a caminho do novo doutoramento que me viria a dar equivalência  e ia ficar em Aveiro! Mas...já tinha estado em Paris quase três anos, longe da família, já tinha colocado a família sempre em segundo lugar.... e não aceitei. Foi talvez uma das decisões mais dolorosas da minha vida profissional (também não fiquei em Nancy!)

Entretanto houve um concurso e entrou a Helena (creio que, no mesmo, ou logo a seguir, entrou a Ana Isabel Andrade)!  Alguns anos depois, «estreei-me» a arguir  a minha primeira tese em Portugal (já o tinha feito em  França) e ...não sei se era eu ou a Helena a mais nervosa! Fiquei em outras instituições, colaborei com muitas, mas os laços com Aveiro informais e formais mantiveram-se. Sou investigadora do CIDTFF. E, nas provas de Agregação, foi a primeira vez que argui um relatório!

Temos seguido uns caminhos paralelos, outros que se cruzam e este foi para mim um momento único nesse percurso: participar  numas provas  que, como foi reconhecido publicamente, são motivo de orgulho para a Universidade de Aveiro e para o Ensino Superior.
Foram provas públicas com assistência de todo o país. Não é costume provas públicas serem comentadas em blogues, mas também não havia blogues. Comecei a comentar algumas provas de doutoramento e de mestrado, as muito boas ou excecionais (quando tenho tempo) , aqui, nesta «Universidade» para que outros possam aprender ... É  por esse motivo que se fala da inteligência coletiva quando se fala de blogues!  Mas há um risco que vou correr: não consigo, em pouco tempo e em pouco espaço, mostrar o brilhantismo (cf. critérios em artigo sobre estas provas)  da Helena nas Provas, mas mesmo assim, vou correr o risco! (Depois lerão os artigos de Helena Araújo e Sá !)

Sob a forma de blogue forçosamente rápida, aqui deixo algumas reflexões. Foram provas  em Didática das Línguas-Culturas,  disciplina que, de acordo com as definição  de Galisson, declinada de modo semelhante por Isabel Alarcão,  tem em conta a contextualização (o relatório não só contextualiza  a Unidade Curricular na história da Didática, como no meio instituinte, meio instituído, no tempo e no espaço (categorias do modelo de Galisson), nomeadamente no Centro de Investigação, na Universidade, no Mestrado, nos projetos Internacionais Galatea e Galapro...), passa pela observação (as várias investigações próprias e dos estudantes (categorias agente, sujeito e grupo)   tem em conta a observação-problematização e a problematização alimenta a ação e reciprocamente),  implica a  conceptualização (presente não só no rigor na documentação dos documentes entregues como na fundamentação da defesa- cf CV nomeadamente  número de artigos publicados em revistas nacionais e internacionais (categorias objeto língua-cultura), a intervenção e a inovação (a intervenção nos projetos reflete-se no relançar das problemáticas em novos contextos, no formato de b-learning adotado, nos dispositivos da WEB 2.0 (categoria estratégias, meios) convocados nos projetos e analisados (não só as representações mas também as interações)...

Por deformação profissional, alimentada pelas leituras recentes em neurociências, centrei a observação da aula da Helena na intercompreensão em língua materna, ao mesmo tempo que acompanhava a problemática da intercompreensão em LE . A Helena pediu-me para partilhar com ela essa observação. Foi uma aula sobre «intercompreensão». Então como é que eu co-construí (tinha tido a versão escrita, muito bem escrita, como todos os outros documentos!) o sentido da aula?  Para além de outras dimensões, a Helena distinguiu duas dimensões na intercompreensão: a relacional e a cognitivo-estratégica.
E na relacional, incluiu os procedimentos multimodais (Cf. apresentação, não referiu oralmente).

Então vamos ver estas dimensões: De pé, com os apontamentos na mão direita e a mão esquerda livre, leu muito bem o texto (confesso que no princípio fiquei surpreendida pelo facto da Helena seguir o que parece ser a tradição da leitura quando comunica tão bem e... até nem parece ser uma pessoa convencional! Tratava-se de uma aula, hoje! ), as sequências eram pontuadas pelo ritmo, pela voz, voz tão suave nas transições... A mão esquerda ficava livre para o gesto «mise en geste» que precedia a «mise en pensée», como quando procurava, ou parecia procurar, e levar o interlocutor a antecipar palavras como «configurações», palavra declinada na  apresentação multimédia através da metáfora visual  que se ia construindo, também ela, antes da verbalização de «configurações».Um exemplo, entre muitos...

Recorreu, assim, ao que  alguns autores designavam há alguns anos como « comportamentos de convergência interativa» e que Cosnier designa como fenómenos d'«echoïsation» que têm um papel importante na empatia.

Mas que têm, também, um efeito cognitivo (ver dimensões da intercompreensão para a Helena). O gesto ajuda quem está a falar a encontrar a palavra certa (função de « mise en pensée »et de « mise en mots») e  nós antecipamos o que vamos ouvir através do gesto. Fenómeno de «neurones miroirs»(Rizolatti).

Mas a Helena ainda refere que foi de propósito, metáforas icónicas antes da verbalização, sobreposição/complementaridade  de informações no Power-Point, Power- Point multimodal,  pausas na leitura, olhares... dimensão estratégica na intercompreensão.

Foi uma pena a aula não ter sido gravada! Que exemplo para investigar estas dimensões na comunicação pedagógica e para serem analisadas na formação de professores!

Como interrogações ou provocações, não só para a Helena, mas todos nós na área:
Haverá necessidade de outras designações para a disciplina como Didática do Plurilinguismo ou da Intercompreensão quando a Didática das Línguas-Culturas apresenta as dimensões anteriores? A designação Didática das Línguas não é uma designação transitória   entre a DI, DFLE, Didática da Língua materna... e a Didática das Línguas -Culturas, onde cabem problemáticas de intercompreensão, plurilinguismo?

Não haverá necessidade, dado precisamente o contexto, de regressar a  formas mais instrumentais da DL-C centradas na aula de Francês, Inglês ou Espanhol na linha do livro Didáctica da Língua Estrangeira (ASA)? (Paralelamente a estudos sobre intercompreensão que, com a crescente disciplinarização do currículo, vão ter dificuldade de subsistir).

Quando começam em Aveiro (ou em outro lado) os estudos sobre intercompreensão com recurso a instrumentos de eye tracking? Os estudos sobre representações ajudam a compreender mas não explicam os aspetos relacionais e cognitivos, por exemplo.

De forma muito rápida, aqui deixo estas notas, como estímulo para os meus leitores-professores-comunicadores! As minhas desculpas à Helena por ter reduzido as suas provas a estas linhas! Mas como ela própria referiu (o relatório) «deu-lhe energia para trilhar, acompanhada, alguns caminhos» abertos: Aqui estou com vontade de a continuar a acompanhar e... para terminar o post como o comecei: que  poderá haver de melhor quando um professor não pode seguir um caminho ver como outro professor  o seguiu tão bem, com tanta energia, rigor e militância, abrindo tantos caminhos a tantos professores e alunos em Aveiro, em  Portugal e no estrangeiro.Parabéns Helena!

Provas de Agregação

Muitos colegas se interrogam sobre o que fazer nas Provas de Agregação. Nas áreas de Educação, Comunicação e Didática das Línguas-Culturas (as minhas áreas), sendo provas que revelam a maturidade científica e pedagógica do candidato, implicam a discussão de:  um currículo que revele um percurso de investigação, de docência, de intervenção, de gestão e de internacionalização;  um relatório de uma  unidade curricular contextualizado na vida da instituição, do curso, que revele as opções teóricas que sustentam a disciplina e as interações entre investigação e  ação,  a coerência entre os objetivos delineados e as competências visadas, os conteúdos,  as atividades e tarefas, a avaliação e a bibliografia;  uma lição que evidencie as qualidades de rigor científico, de qualidade pedagógica  e de comunicação que levam a que o público sinta vontade de aprender e possa  aprenda.  

Durante o almoço (os almoços são momentos de aprendizagem, mas são cada vez menos frequentes e mais rápidos...  não há ajudas de custo, não há dinheiro,  e não há tempo!)  uma Professora e amiga deu-me  a referência  de um artigo sobre estas provas.   

Paulo Ferreira da Cunha, Professor Catedrático de Direito da Faculdade,  de Direito da Universidade do Porto escreveu um artigo na Revista do SNESup nº 25, 2009, sobre  A Agregação: lei e interpretação que me parece poder ajudar candidatos e membros de júris. Começa, assim, o artigo: 

«O concurso de Agregação é uma prova(ção) muito séria. A tradicional Agregação, o arquétipo da Agregação, desconfia de quem não tenha os créditos de longas vigílias, longas esperas, e os pergaminhos de muitos anos de experiência. E a nova Agregação não poderá afastar-se disso, sob pena de, depois da descida geral do nível dos doutoramentos (felizmente não de todos) e a redução do Mestrado à antiga Licenciatura, se abater a última fronteira de qualidade e exigência académicas».

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Ler palavras por minuto

Espanta-me a necessidade de quantificar o que não é quantificável! Pretender que todas as criancinhas no 1º ano leiam 55 palavras por minuto (ver recentes metas do ME) assusta-me. O meu filho até talvez tivesse sido capaz, como certamente os filhos,sobrinhos, netos de quem teve tal ideia. Mas há investigação sobre leitura em Portugal!  Inês Sim-Sim, Maria João Freitas, Leopoldina Viana, por exemplo, que estiveram envolvidas no PNEP (Programa com implicações nas aprendizagens do Português -  não, não foi só o Plano Nacional de Leitura!) Não quero dizer que os autores do documento não sejam investigadores, mas... já deram aulas ou  assistiram ao que se passa nas escolas, no 1º ciclo,  hoje ?   No jornal  Público, é apresentada uma investigação de Dulce Gonçalves que põe em evidência as diferenças entre crianças na velocidade de leitura.  Já viram a pressão sobre os pais... e sobre as crianças...e então os professores! Já pensaram em enviar cronómetros para as escolas! É evidente que todas as crianças têm de aprender a ler para compreender e depressa... a minha avó e a  minha  mãe ensinaram muitas! Mas felizmente não contaram as palavras que eu lia, nem as que  os outros meninos liam!  Metas são necessárias (até já estavam  bem feitas!), há descritores de desempenho que podem ajudar como referência, mas isto é «terrorismo dos números» (Expressão de Bachelard transposta para a leitura!)

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Reformas educativas e políticas linguísticas

Vai realizar-se nos próximos dias 20 e 21 o Colóquio organizado pela APEF e APHELLE,

Reformas educativas e políticas linguísticas para o ensino das línguas estrangeiras: do século XIX ao século XXI 

Vou falar sobre  «Políticas de (Des)Educação em (e pelas) línguas-culturas – Dos referenciais europeus a práticas portuguesas»

Algumas afirmações:

As línguas são veículo de culturas
As línguas estão nas outras disciplinas
Todos os professores são professores de línguas-culturas
É com as línguas que pensamos
É pelas línguas-culturas que encontramos o outro
Das línguas- culturas  vemos os outros... e onde estamos nós?
O Mundo é plurilingue  e pluricultural
A Escola é plurilingue e pluricultural...

Uma língua é o lugar donde se vê o Mundo e em que se traçam os limites do nosso pensar e sentir.
.....

E, no entanto!   Tanto se tem feito e tanto se tem perdido!

Na linha do que costumo fazer, deixo algumas sugestões de leitura:
Os portugueses e as línguas - Eurobarómetro 
First European Survey on languages competences

LANGUES DANS L’EDUCATION, LANGUES POUR L’EDUCATION Plateforme de ressources et de références pour l’éducation plurilingue etinterculturelle






Agnotologia

Pois... é o estudo da construção da ignorância. Veja-se a crónica de Manuel Maria Carrilho hoje no jornal Diário de Notícias!  Fala  desta «recente disciplina criada por Robert N. Proctor, da Universidade de Stanford, para estudar a ignorância, entendida esta não como algo destinado a ser superado, mas  como algo de intencionalmente fabricado, produzido com a devotada colaboração de diversas formas de informação e de conhecimento».  Dá o exemplo de «conversa de papagaios amestrados em economês/financês».

Numa altura em que saímos bem no retrato sobre a literacia (vou comentar os resultados do Relatório que acabou de sair em outro momento), pois é...  há quem tenha problemas de iliteracia, numérica, quem desconheça como as famílias fazem contas, quem não saiba o número de alunos, quem não saiba ler a cara dos portugueses, ou não o queira fazer!  

«Intertextualidades»: Exposição de pintura de Antígona/Clara Ferrão

Está patente, até 6 de janeiro de 2024, no Centro Cultural Penedo da Saudade , do Instituto Politécnico de Coimbra, uma exposição de pintura...