A primeira grande dificuldade de um investigador prende-se com a questão de investigação. Antes de ir para França, fui falar com o Senhor Professor Doutor Albano Estrela. Como sempre, recebeu-me com o entusiasmo, o carinho, a compreensão com que recebia todos os estudantes e perguntou-me qual era a minha questão. Aí respondi com o atrevimento de principiante: «a autonomia». «Bom, isso é o tema!». Depois perguntou-me qual a metodologia: e respondi: «vou fazer uns questionários para saber as representações dos professores». «Ora, minha filha, essas são as respostas de todos os principiantes!»
O que me preocupa é que, hoje, não são só principiantes que dão respostas destas! Até em provas!
São por vezes temas engraçados, às vezes mesmo interessantes, mas muito pouco demonstrativos!
Então vamos lá conversar um pouco:
Uma investigação em Didatologia- Didática das Línguas culturas, como em Educação, em geral, passa por uma fase de problematização, num contexto, implica conceptualização e tem implicações.
Numa fase em que tantos professores fazem tantos sacrifícios para frequentarem mestrados e doutoramentos é obrigação dos orientadores terem presente a coerência entre as diferentes componentes e a existência de implicações «une thèse qui n'est pas utile est futile». Tem que contribuir para melhorar algo.
Não se investiga um tema, mas uma questão que surge num contexto. Uma vez formulada a questão, definem-se objetivos (e não o contrário). O enquadramento teórico permite definir conceitos-chave e construir uma grelha (não é a história da televisão ou das TIC, muito menos políticas... a não ser que o estudo seja sobre história ou políticas).
Para o enquadramento metodológico, não se faz também a história toda dos métodos qualitativos e quantitativos. Justificam-se as opções tomadas.
Se nos interessa saber
- o que pensam x das TIC- análise das representações
- o Quê? O que dizem fazem... - análise de conteúdo
- Como - análise do discurso
Mas será que um estudo de um professor sobre representações tem implicações? Contribui para a melhoria de alguma coisa?
Saber o que pensam as pessoas dos políticos é importante para os jornalistas, o público e para os políticos. Sempre se podem comparar representações, em diferentes momentos, de muitas pessoas, através de técnicas de amostragem.Trata-se de estudos com valor sociológico. Agora... saber o que pensam 30 pais sobre o ensino do Francês ou do Inglês, ou 20 alunos do ensino das Ciências ou das TIC? Quais as implicações? Confesso que não vejo o interesse de estudos (os mais frequentes) que ficam por esta questão das representações em educação.
Mas interessa saber quais as marcas que uma inovação (por exemplo o quadro interativo multimédia) provocou nas práticas do professor, nas aprendizagens... Nessa altura, não será necessário (e possível no tempo em que desenvolvem os projetos, nos diplomas em Bolonha ) observar, transcrever, analisar um «corpus» - e não se fala de amostra - composto com dados de muitos agentes, mas recolher dados de alguns casos que permitam tirar conclusões que sirvam ao próprio e aos colegas (leitores de artigos) para melhorarem as suas práticas e contribuírem para a melhoria das aprendizagens. Até pode ser interessante, neste momento, saber o que pensam os professores ou alunos de para compreender os dados, mas trata-se de dados complementares.
O investigador recolhe dados que lhe permitam identificar marcas que traduzam as mudanças: cadernos de alunos, print de quadros, diários, testes, fichas, notas de observações... regista aulas em vídeo, momentos em que os alunos estão no computador, nos quadros.... em função sempre da questão- chave.
Procura «cartografar sistematicamente» uma determinada situação, utilizando durante o tempo máximo que lhe permita chegar à conclusão que esgotou, naquela fase, a recolha do «corpus». Utilizou uma metodologia etnográfica. Kozinets fala de metodologia netnográfica quando se trata de investigar a questão de saber «o que se faz com a internet?». Identificar marcas de aprendizagem na Internet sobre um assunto, num determinado momento, identificar marcas de utilização de plataformas... passa por metodologias netnográficas que recorrem a testes de usabilidade (não confundir com fichas heurísticas de sites) que permitem responder a questões do tipo: «que fazem os sujeitos, durante x tempo, quando resolvem um problema a partir de um site?». Como é fácil encontrar na net, não cito.
E agora há os métodos de traçado dos percursos. Já referi o susto que apanhei quando vi o meu traçado no Facebook. Há um ano, quando apresentei «o meu museu» , na minha homenagem em Faro, achei muita piada, mas este tratamento estatístico com http://www.wolframalpha.com...assustou-me, mas é uma ferramenta indispensável para todos os investigadores que queiram trabalhar sobre estas questões.
Ao trabalho! Simplifiquei o que não é fácil simplificar, correndo os riscos das simplificações!
Para quem quiser aprofundar este tema, sugiro a leitura da obra coordenada por Carmen Guillén e publicada pelo Ministerio de Educación e Ed Graó. No meu artigo desenvolvo os tópicos aqui apresentados.
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