domingo, 19 de novembro de 2017

Orientação de teses realizadas por professores

Num momento em que se fala tanto da progressão de professores de todos os graus e disciplinas,  é necessário pensar-se nos cursos que frequentam, nos diplomas que lhes são atribuídos em provas públicas e nas implicações das problemáticas estudadas na melhoria da sua ação profissional.

Em teses  até muito boas interrogo-me  algumas vezes sobre as implicações dos estudos em causa até para o próprio candidato. Houve alturas, em que se acumulavam créditos  em formações sobre temáticas bem interessantes, mas muito pouco úteis em termos de educação.  Os cursos de longa duração têm necessidade de ser escolhidos com a finalidade de melhorar a ação profissional do candidato, contribuir para melhorias na instituição e contribuir para o progresso da disciplina científica, através da adoção de metodologias adequadas que, em áreas como a educação, não têm necessariamente de ser de tipo quantitativo. Em educação, nomeadamente, em Didática das Línguas-Culturas, é necessário desenvolver estudos sobre o que se faz e o que se diz (e como se diz) nas aulas.  

A minha última doutoranda, docente de uma Escola Superior de Hotelaria e Turismo,  veio propor-me uma tese já começada  sobre as representações dos empregadores sobre as línguas em hotelaria. Ficou estarrecida, quando lhe disse: «eu já sei as respostas».
E assim, esta «história» acabou e começou uma nova história, se dúvida,  com muitos mais obstáculos, mas também com mais adjuvantes (já que a candidata aceitou o desafio de ver com «eye tracking» o que se passava com os materiais pedagógicos que utilizava e...  eu era uma fraca adjuvante nesse domínio, apesar de, até em pintura, andar a estudar estudos com essa metodologia).      

E a história ficou terminada no dia 15 de novembro, com provas públicas! Alguns comentários extraídos da minha arguição,  em provas públicas, poderão, talvez, ajudar outros candidatos ou jovens orientadores: 

«A tese apresentada pela mestre Dulce Mendes Sarroeira à Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias  intitulada  Educação em-para-e pelas línguas de acção académica e profissional: para uma perspectiva acional e multimodal do ensino do Francês apoia-se, quer em termos temáticos quer metodológicos, em Didática das Línguas e das Culturas, partindo de uma  problematização em contexto profissional, tendo exigido à candidata a conceptualização prévia, com a construção de um enquadramento teórico sólido,  e a conceptualização posterior, decorrente do projecto de investigação-ação que desenvolveu. Trata-se, por isso, de uma tese com implicações na competência profissional da professora de uma escola de turismo e com implicações para outras  investigações e para  a prática de professores de línguas-culturas. (É uma feliz coincidência escrever este post no mesmo dia em que apresento, neste blogue, o número 4 da Revista Synergies Portugal, em homenagem a Robert Galisson). 
A tese  apresenta interesse conjuntural, dada a necessidade de se compreenderem os efeitos produzidos por ambientes e dispositivos tecnológicos nas aprendizagens dos alunos, através da identificação de marcas discursivas multimodais.
A candidata procedeu a uma revisão rigorosa da literatura quer em termos pedagógicos quer em termos investigativos, numa perspectiva diacrónica e sincrónica, perspetivando o ensino da língua francesa numa linha de estudos  sobre o papel das línguas na educação e, nomeadamente, das línguas nas outras disciplinas, orientação proposta pelos  trabalhos doConselho da Europa,  com a finalidade de  garantir a equidade na educação, em consonância com Recomendações Europeias.  A candidata procurou identificar o potencial de  aprendizagem decorrente de mudanças na sua ação didática (mudanças no espaço e tempo de aula,  nos  dispositivos tecnológicos e conversacionais  e na perspetiva didática).  Na  investigação-ação, afastou-se , assim, da linha das línguas «aplicadas» ao mundo empresarial  assente numa conceção funcional, centrada nos léxicos específicos (abordagem semasiológica), para adotar uma abordagem «acional», em consonância com os princípios dos estudos sobre as línguas, centrados no desenvolvimento de competências transversais que se traduzem em operações cognitivas e discursivas comuns a diferentes campos profissionais (abordagem onomasiológica). 
Na perspetiva investigativa (interligada com a ação) aprofundou o conceito de multimodalidade e procurou adotar metodologias que permitissem identificar marcas dos efeitos produzidos por dispositivos e suportes multimodais nas aprendizagens dos estudantes, sob os pontos de vista cognitivo, empático, relacional e discursivo. Adotou uma perspectiva etnográfica que lhe permitiu identificar alguns  desses efeitos. O recurso a questionários e entrevistas permitiu à candidata   identificar representações sobre os efeitos dos dispositivos tecnológicos utilizados e das mudanças didáticas adotadas.  Para identificar mudanças nos discursos orais e escritos da professora e dos estudantes, a candidata serviu-se dos «analíticos» da plataforma Moodle e de transcrição de registos áudio e vídeo.  Serviu-se igualmente da metodologia eye tracking para detetar mudanças decorrentes do uso de formatos diferentes dos mesmos materiais pedagógicos (...).

O facto de saber,  à partida, que a sua problemática  investigativa implicaria riscos e de ter consciência  que, em educação, é necessário encontrar técnicas e instrumentos tecnológicos que permitam identificar marcas de efeitos produzidos pelos instrumentos e dispositivos tecnológicos é revelador do perfil de investigadora da Dulce Mendes Sarroeira».

Poderia referir ainda neste post  o cuidado  na materialidade gráfica e o rigor na escrita. 

E, assim, a candidata passou a «doutora» e a orientadora ficou satisfeita. Também ficou satisfeita com a apresentação multimodal feita pela candidata e com a qualidade revelada nas provas.  Uma apresentação mais pormenorizada dos resultados do estudo poderá ser lida em  futuros artigos. 
A história continua.   

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