quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

«Intertextualidades»: Exposição de pintura de Antígona/Clara Ferrão

Está patente, até 6 de janeiro de 2024, no Centro Cultural Penedo da Saudade, do Instituto Politécnico de Coimbra, uma exposição de pintura de Antígona. No catálogo, a professora Clara Ferrão evidencia a relação que estabelece com a pintora Antígona. Antígona pinta, como referiu uma das visitantes «os artigos de Clara Ferrão» ou ainda, como referiu um antigo estudante «Antígona pinta as aulas de Clara Ferrão».   A professora fornece os conceitos e  as «histórias» que Antígona, que se assume como pintora narrativa, transforma. A apresentação esteve a cargo de José Augusto Bernardes, professor catedrático da Universidade de Coimbra.

Intertextualidades

 

«Todo o texto se constrói como um mosaico de citações, todo o texto é absorção e transformação de um outro texto »[1]




A definição de intertextualidade de  Júlia Kristeva,  em epígrafe, poderia constituir o único «texto» desta exposição. A comparação com o mosaico, mosaico de textos, mosaico  de cores, de formas, de técnicas, mosaico de experiências, de leituras, de viagens…  resume a relação entre a professora Clara Ferrão e a pintora Antígona, resumindo, igualmente, o processo criativo e técnico da pintora. Antígona constrói os seus «mosaicos»  em palimpsesto[1],a partir da  «absorção» de textos de Clara Ferrão e transforma-os, pintando sobre  eles.   A pintora apaga, no “pergaminho”,  inscrições (frases, imagens, cores) que estão na sua memória, ou na de Clara Ferrão, para as substituir  por pinceladas e  manchas suas, deixando, no entanto, transparecer vestígios de inscrições anteriores, o que leva a diferentes leituras, convocando recordações, por vezes,  comuns aos «leitores».  Nos trabalhos de Antígona ouvem-se as aulas, ou as narrativas, nas «vozes» de Clara Ferrão, mas também, as «vozes» de centenas de alunos que com ela dialogaram. E as  «vozes»  de cientistas, escritores, pintores, músicos, bailarinos… umas vezes, de forma explícita, recorrendo a colagens;  outras vezes, vozes,  textos e  telas interpenetram-se , deixando transparecer porosidades entre os vários planos. Antígona deixa pinceladas  nas palavras da leitora, investigadora, observadora, professora de literatura, de linguística, de análise dos média, de didática das línguas, de educação. E sobretudo… diverte-se a construir os seus mosaicos com  as suas histórias!  E a partilhá-los!.

Os trabalhos apresentados nesta exposição, intitulada  Intertextualidades, englobam  duas configurações conceptuais  comuns à professora e à artista: comunicação interpessoal multimodal e «mestiçagem de culturas».

 A comunicação  multimodal surge,  porque «não podemos não comunicar» uma vez que «não podemos não ter comportamento»[2]. Assim, o contexto, o espaço, o tempo, o corpo e os dispositivos tecnológicos condicionam a comunicação interpessoal e multimodal.

Propor trabalhos agregados  pelo conceito de «mestiçagem de culturas» justifica-se  nesta exposição, sobretudo neste contexto de comunicação multimodal, num  Centro Cultural do Ensino Superior Politécnico. A expressão é utilizada   no  sentido que tem, na origem, o pensamento do filósofo Michel Serres[3]:  «mestiçagens de culturas humanísticas, científicas, artísticas, tecnológicas». Clara Ferrão  declinou este conceito,  enquanto professora  e  ex-vice- presidente do Instituto Politécnico de Santarém, deixando marcas desta visão da educação  nos próprios  estatutos e planos de estudo da sua instituição. Já Antígona é uma pintora «mestiça», definindo-se, ainda,  como  pintora narrativa. Esta exposição é a história do encontro de Clara Ferrão com Antígona.  O catálogo foi construído também como um «mosaico» de  «textos» de Clara Ferrão – pretextos  para o traço de Antígona que, no seu jogo, dá a ler,  a olhar, ou a ouvir interiormente, algumas das vozes convocadas nos seus «textos».

 Vozes e olhares cruzados das duas que procuram cruzar-se com o público! 

 



[1] Júlia Kristeva, Poética nº27, 1974

[1] «Toute écriture est un palimpseste», segundo Gérard Genette,1982.

[2] Paul Watzlawick. Une logique de la communication,1967.

[3] Michel Serres, «Le tiers instruit», Paris : Folio,1992. 

Formação de professores... notas soltas

 

Formação de professores… em 2024...

E agora?

Não há professores, não há formadores e não há pensamento estruturado em didática das disciplinas…

Não vai ser fácil, mas já vivemos situação semelhante nos anos 70- 80! Em 1976, havia uns 20 formadores para cada disciplina a nível nacional. Eu, com 24 aninhos, fui a formadora mais nova neste grupo de “metodólogos” de francês! Mandaram-nos para França, chamaram especialistas de Didática de França, de Inglaterra, do Canadá… Foram elaboradas bibliigrafias mínimas ( José Afonso Baptista obrigada!). Começaram muitos mestrados e doutoramentos. Formaram-se os professores que iriam apoiar os professores com habilitação própria ( profissionalização em serviço, exercício… ). Houve n colóquios em didática das disciplinas. Houve pensamento estruturado, investigação, mestrados, doutoramentos, congressos, mobilização de associações, publicações… Insisto “ pensamento estruturado em Didática das disciplinas. Em 2006, houve o Pnep e os outros programas.

E depois… reformaram-se os formadores, as instituições apostaram em cursos de “ tudo”, encheram quadros em função de “ tudo”, menos de professores! Os departamentos de didática foram fechando, os doutoramentos idem… voltámos aos doutoramentos em linguística ou em educação, mas em estudos de género, sociologia, tic… estudos sobre representações.

Mas onde andam investigação sobre efeitos das práticas nos resultados, marcas de aprendizagem com dispositivos digitais? relação entre as resultados do Pisa e as várias opções pedagógicas tomadas? que escreviam as crianças do Pnep em 2006-2010 e o que escrevem hoje? Quantos livros liam e como? Que escreveram os alunos na pandemia? Que leram? (É fácil comparar cadernos, ver estatísticas das plataformas…)? E durante estes últimos anos?

As bibliografias dos cursos limitam-se quase sempre a artigos dos próprios professores e amigos! Em linguística ou educação em geral… Que livros há de didática na livraria Almedina, por exemplo? Nos anos 80, em Coimbra, havia um piso dedicado às publicações para professores. Há 2 dias, podiam contar-se pelos dedos das mãos. Na internet, quantas investigações podemos ler? Até passam nos crivos das publicações conhecidas e contribuem para os rankings, mas não têm implicações, não são lidas por professores. Tenho de abrir uma exceção: em didática das Ciências e Matemática ainda se vêem alguns. Os manuais nas livrarias e os exercícios dos manuais on line estão completamente desfasados no tempo.

Como não há pensamento em didática, há um desfasamento entre as potencialidades dos meios digitais e as propostas didáticas.

Também não há pensamento didático que suporte a decisão política. Depois da centração nos conteúdos de Crato, houve uma política errática que acompanhou as greves. Com que bases se extinguiram exames? Quais os efeitos? Até pode ter havido efeitos positivos. As competências essenciais estão relacionadas com conteúdos essenciais. Porquê estes discursos opostos? Não é por agora terem voltado a ditados ( sempre os fiz) que os meninos franceses vão aprender melhor. Esta discussão e os maus resultados no Pisa não são só de Portugal.

Houve boas práticas que resolveram problemas. Mas analisem resultados! Promovam formação de professores! Retomem modelos que deram resultado, adequando-os ao contexto! Construam bibliografias básicas! As didáticas das disciplinas são essenciais na formação de professores! Os professores que estão a entrar no sistema têm de adquirir formação em didátida. Não é por se ter x créditos de inglês ou por se ser inglês que se ensina inglês! Não é por haver desempregados entre os estudantes que receberam cursos “ de tudo” ( há designações bem apelativas) que vamos passar a ter professores de português ou de matemática.

 

Resultados do PISA e programas nacionais de formação de professores

 

Habituei-me a escrever estes textos mais curtos no Facebook, mas resolvi voltar ao Blogue.

Todos falam dos resultados do PISA, mas ninguém se interroga sobre as razões dos progressos de 2012 a 2018. Em 2006- 2010 foram lançados programas de formação de professores do 1° Ciclo de Matemática, Ciências e Português destinados a “mudar as práticas dos professores”. Muitos materiais foram elaborados pelas equipas dos programas. A ministra da educação da altura, Maria de Lourdes Rodrigues, adotou algumas medidas que desagradaram aos professores ( com intervenções extremamente infelizes), mas teve a coragem de começar a formação de professores pelo 1° Ciclo ( e os professores aderiram). Infelizmente os programas foram cancelados por ministras mais “modernas” que achavam que alguns dos conteúdos ou atividades que visavam o “ensino” ( sublinho) da leitura ou de escrita, por exemplo, limitavam muito a criatividade. E depois veio o Sr Ministro Crato que achava que haveria professores a mais e que os professores não precisavam de formação e … De um dia para o outro ouvi “ agora já não há Pnep, já não é preciso fazer essas atividades” que exigiam muita leitura, muita escrita, muita expressão oral, muita gramática…

Os materiais ainda andam nos arquivos do Ministério. Não, não estão desatualizados! Não haverá ninguém que os coloque numa plataforma visível? Eu estive na coordenação do PNEP ( Programa Nacional para o Ensino do Português)! Fui paga para estudar, formar professores e produzir materiais!

Faço um balanço muito positivo baseado nos produtos que vi. Os alunos do PNEP poderão ter contribuido para a melhoria dos resultados da avaliação PISA ! Era preciso relacionar, avaliar… Há tanto desperdício de trabalho, de estudo, de materiais…


Homenagem a Santana Castilho

Não me despedi do Professor e amigo, porque, há uns tempos, deixei de ler os seus artigos e a Covid impede-me de estar hoje com ele. Mas, vo...