terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Repensar a educação. Investir nas competências

para melhorar resultados socioeconómicos. COM (2012)669 final.

À primeira vista, gosta-se desta comunicação da Comissão Europeia para o Parlamento, documento base de orientação para os governos europeus. Deve ser, por isso, que o senhor ministro ´fala de «competências». Já não é mau!

Um dos problemas que surgiu relativo às competências («saberes em uso», pelo que não pode haver uso sem saberes o que tiraria todo a  sentido à polémica)  foi uma interpretação muito soft e muito interdisciplinar das competências. Daí que também eu tivesse ouvido o comentário seguinte « Agora só interessam as competências, não precisamos de ensinar saberes», competências como trabalhar em grupo, adaptar-se a diferentes circunstâncias, ser criativo...

Quando em documentos oficiais mais antigos se falava em «competências» pensava-se em «dimensões formativas das disciplinas». (Sou co-autora do livro «Dimensões formativas em Línguas», publicado pelo IIE, nos anos 90 do século passado). As competências nas línguas, os tais saberes em uso como sublinhava Maria do Céu Roldão, coordenadora da coleção do IIE,  implicavam o domínio de saberes culturais e linguísticos e a sua mobilização na competência comunicativa ou pluricomunicativa. O modelo finlandês estava muito presente nos documentos europeus e nacionais.

Nos documentos do Conselho da Europa, ainda, está presente esta grande finalidade do ensino das línguas-culturas: as línguas  para educar, na construção do conhecimento para comunicar com os outros e viver com os outros. Veja-se até só o título da Plataforma do Conselho da Europa:
LANGUESDANS L’EDUCATION, LANGUES POUR L’EDUCATIONPlateforme de ressources et de références pour l’éducation plurilingue etinterculturelle

Estranha-se, por isso, a orientação deste  «Repensar a educação...», documento  orientador de políticas europeias de educação centrado  na «empregabilidade».

Juntando vários subtítulos do referido documento temos o seguinte texto (respeitam-se as reticências nos finais de subtítulos), um pouco estranho:

«Há que centrar esforços no desenvolvimento de competências transversais... em particular as competências empresariais...enquanto a procura de competências STEM (Ciências,tecnologias,engenharia, matemática) ainda é elevada...mas, o primeiro passo tem de ser a aquisição por todos de competências fundamentais ou de base (numeracia, literacia,matemática e ciências de base)...enquanto a aprendizagem das línguas é importante para o emprego e requer especial atenção». A seguir vem capítulo intitulado «Competências profissionais»

Primeiro comentário:  os «enquanto» parecem  desqualificar as línguas.

Segundo  comentário: é necessário respeitar uma decisão do Conselho Europeu de Barcelona em 2002: «língua materna mais duas» é referido no documento. Não é mau!

Terceiro comentário: Que são competências empresariais? Que são competências para a empregabilidade?
Muitos dos jovens ( e velhos)  que estão no desemprego será que não têm competências para o emprego?
Só que os empregos foram extintos! Não há emprego para todos se continuarem a fechar escolas, hospitais, restaurantes... E o que são as competências empresariais? «Criar o seu emprego...», mas se os  outros os tiveram de fechar! Durante quanto tempo lhes são dadas facilidades? E depois?

Quarto comentário: AS LÍNGUAS (suponho que outras disciplinas também não) não são um objeto que se adquire para ter um emprego! A educação serve para formar cidadãos o que implica saberes, competências de ordem mais relacional, de ordem comunicativa, de ordem funcional... atitudes e valores. Cidadãos formados podem encontrar um emprego  mas... se o houver!

Quinto comentário: Esta visão profissionalizante (ver parte) até funciona na Alemanha com alguns jovens que fazem estágios nas empresas. Até concordo. Será que há empresas para oferecer estágio para todos os jovens que procurem este modelo?

Sexto comentário: A Alemanha não está a recrutar arquitetos, enfermeiros, engenheiros em Portugal? Formações longas, muito caras para o país e para os pais que levaram à formação de jovens que encontram emprego e que não estiveram sujeitos aos «curricula empresariais», mas curriculos com uma visão formativa.

Substituiu-se o modelo finlandês pelo alemão neste documento. Nos últimos anos, houve  muitas medidas que levaram ao sucesso no modelo português. Há aspetos positivos e negativos em todos! Não sou nada de compartimentar... e de designar mas este documento irritou-me! «Repensar» para quê? Repensar sim, não creio que seja esta a melhor via!

      

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