Texto que deu origem a apresentação oral na cerimónia de inauguração do busto de Homero Pimentel, em Arganil, há alguns anos e que torno público nas redes, na comemoração do centenário do seu nascimento.
Homero Pimentel: um professor com sucesso
Ao escrever este artigo hesitei
no título… Podê-lo-ia ter intitulado: «Credo meninos credo! Tanta ignorância!»
ou «Colégio de Arganil: uma escola privada democrática antes da democratização
da escola pública» ou ainda: «De como um professor transforma alunos condenados
ao insucesso em alunos de sucesso».
São estes
os tópicos que abordarei na minha singela homenagem ao Dr. Homero. Procurarei
abordá-los não de uma maneira passadista, mas situando-os em relação a alguns
temas que são objecto de discussão, quando, hoje, falamos de educação.
Retomo a exclamação que todos os alunos do Dr.
Homero ouviram e certamente não esqueceram: «Credo meninos credo! Tanta
ignorância!». Também, agora, ouvimos referências à ignorância dos nossos
alunos. Será então de procurar «modelos», procurar «boas práticas» que
conseguiram vencer a «ignorância». Homero Pimentel era um professor «mestiço»,
no sentido que é dado a este termo pelo filósofo francês Michel Serres: um «mestiço» de cultura
humanística, artística e científica. Foi professor de quase tudo: Latim, Grego,
História, Filosofia, Francês…Explicador (para todos e gratuitamente) de quase todas
as disciplinas. No Colégio de Arganil
fazia-se o que hoje se poderia designar de «estudo acompanhado». Até apanhei
reguadas porque tive negativa a Matemática! Mas ensinou-me a aprender Português
e ensinou-me a APRENDER Matemática e todas as outras disciplinas. Com ele,
desenvolvi «competências de aprendizagem». Com a vasta cultura que possuía,
levava-nos a contextualizar conhecimentos, a relacionar, a descobrir «Os
Lusíadas». Com que emoção lia o episódio de Inês de Castro ou com que vivacidade
e humor explicava a «Ilha dos Amores»! Levou uma geração de meninos que nunca teria saído das suas
terras a Atenas, a Creta, a Roma, a
viajar nos países que ele próprio nunca teve a oportunidade de conhecer. Michel
Serres refere que «aprender é viajar»: foi uma viagem que todos nós fizemos.
Viagem, no tempo e no espaço dos conhecimentos, antes da «sociedade do
conhecimento».
Viagens «à vila» nos dias em que
éramos «corridos». «Fujam meninos fujam…» Era a maneira exagerada como
manifestava a sua impotência para combater a nossa «ignorância». O carinho e o
humor que se seguiam a estes momentos de forte emoção depressa nos faziam
esquecer o episódio. Ou, talvez não… «ser corrido» significava «ser crescido» e
implicava a partilha de emoções, a solidificação de laços de grupo, a
disponibilidade para descobrir os outros. È evidente que estas práticas têm de ser
situadas no contexto dos anos 50 e 60. Numa sociedade em que nós os pais
consideramos que os nossos meninos têm sempre razão e em que os trabalhos de
casa estão no banco dos réus não será de estranhar algumas reacções a este
elogio? Mas como explicar a nossa vontade de participar nesta homenagem ao Dr.
Homero?
O Colégio de Arganil foi uma
escola privada democrática antes da democratização da escola pública. Nele
conviveram muitos alunos, alguns marcados por um percurso de insucesso em
liceus e outros colégios e muitos outros que pertenciam a um meio económico, social e cultural que os
teria condenado ao insucesso. E fomos muitos os que tivemos sucesso. Homero
Pimentel constitui um exemplo a seguir pelo rigor do seu trabalho, pelo seu
entusiasmo generoso nas relações humanas, pelo seu respeito pelos outros, pela
sua sensibilidade, pela sua cultura humanística, pela sua extrema modéstia.
Com o Dr. Homero aprendemos a conhecer, aprendemos a fazer, aprendemos a
aprender e aprendemos a SER: «pilares da
aprendizagem» para a sociedade do conhecimento» apontados no relatório da UNESCO da Comissão Internacional para a
Educação no Século XXI, coordenada por Jacques Delors.
No que me diz respeito, tive a
sorte de ter outros «modelos» de professor na família, mas, certamente, foi por
sua causa que me tornei professora de Português e de Francês e muitos exemplos
de «boas práticas» que apresento aos professores que tenho formado aprendi-os
no Colégio Alves Mendes. Obrigada Dr. Homero.